Mato Grosso é o celeiro do agronegócio e representa hoje mais de 50% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado. No Brasil, 70% dos alimentos que chegam à mesa vem do suor e esforço do trabalho de produtores rurais. Ainda assim, na maioria das vezes são considerados os “vilões” na cadeia produtiva, os que ganham dinheiro e ficam ricos.
No entanto, a história não é bem assim. O produtor rural é o que move a economia do país no batente árduo do arado. Ainda que venha ficar com a “corda no pescoço” quando precisa de empréstimo a juros altos para investir, por exemplo, em uma colheitadeira de R$ 2,5 milhões. Preço de apenas um dos maquinários utilizados e que com seis meses de uso já desvalorizou de 40% a 50%, sem falar dos custos de manutenção.
Quando se fala de produtor rural, é preciso calcular os gastos com adubo, calcário, insumos em sua maioria importados a preços comandados por mercados internacionais (preços dos fertilizantes foram nas alturas com a guerra da Rússia e Ucrânia). E a terra para plantar? A mais em conta avaliada em torno de 600 sacas de soja o hectare.
Produtores considerados bem-sucedidos no agro nos dias atuais assim se destacaram a duras penas, dificuldade e sofrimento. Foram eles que em sua maioria fundaram a maioria das cidades de Mato Grosso, custeando aberturas de estradas, pavimentação de rodovias, construção de igrejas e escolas. E essa conta ninguém mostra. O produtor rural precisou investir em tecnologia para o campo e esse dinheiro, geralmente, veio de empréstimos com altas taxas de juros.
É o produtor rural também que arca com os passivos ambientais. É claro que o cuidar da floresta e aqui não se nega o dever de proteger o meio ambiente, mas porque a conta só cai nas costas do produtor rural brasileiro? Não se vê bancos financeiros pagando passivos e mantendo floresta em pé. Na verdade, exigem um ativo ambiental bacana, cuidado e zelado pelo produtor. E, ainda assim, os produtores são taxados de poluidores porque o gado emite gás metano e máquina agrícola gás carbônico.
E se chover demais? A boa colheita não vem. E se chover pouco? A soja, o milho não nascem. O produtor rural que arca com os prejuízos e ainda assim é marginalizado quando se está numa recuperação judicial ou acordo de recuperação de crédito. E ele não chegou nessa situação porque desviou dinheiro ou tem valores, diamantes e bens guardados nas ilhas Cayman. É porque esse produtor rural trabalha e tem tudo alavancado. Ou seja, está endividado porque o custo para plantar é alto e só quem está na lida do campo sabe o preço que se paga.
Em Mato Grosso, mais de 90% dos grandes produtores possuem algum tipo de dívida. E é esse mesmo produtor rural que gera em torno de mil empregos diretos e indiretos em uma fazenda de médio porte. A cadeia produtiva tem um custo enorme e quem ganha no final das contas? Sem sombra de dúvidas as tradings que operam no mercado financiando o agricultor com compra de safra adiantada, via cédula de produtor rural, e juros diretos e indiretos altos. São esses mesmos financiadores que também negociam para o produtor os insumos necessários e assim ganham dos dois lados.
Isso tem sido um problema para o sistema produtivo brasileiro. Compram uma saca de soja por R$ 160 e vendem por R$ 400 para o mercado internacional. Esses sim são os que estão levando uma grande fatia do negócio do agro, setor econômico este que sustentou o país na época da pandemia e que continua sendo a alavanca do país. Neste contexto, falo também dos pequenos produtores que vendem a alface por R$ 1, mas o preço no mercado está R$ 5. A culpa fica com o produtor, mas não é ele o vilão do sistema.
Antônio Frange Jr. é advogado especialista em recuperação judicial e produtor rural
Publicado no Jornal A Gazeta, edição N° 10.870, 30 de maio de 2022.